Nós temos partidos de mentirinha', diz Barbosa em crítica ao Congresso
FELIPE SELIGMAN - DE BRASÍLIA
Ainda sob o efeito das recentes rusgas entre o Judiciário e o
Legislativo, o presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Joaquim
Barbosa, afirmou nesta segunda-feira que os partidos políticos são de
"mentirinha" e que o Congresso Nacional é "ineficiente" e "inteiramente
dominado pelo Poder Executivo".
As declarações foram feitas durante uma palestra proferida no IESB
(Instituto de Educação Superior de Brasília), instituição da qual é
professor.
Câmara pode anular votação de projeto que causou crise com STF
Barbosa diz que reduzir poderes do STF fragiliza democracia
"Nós temos partidos de mentirinha. Nós não nos identificamos com os
partidos que nos representam no Congresso, a não ser em casos
excepcionais. Eu diria que o grosso dos brasileiros não vê consistência
ideológica e programática em nenhum dos partidos. E tampouco seus
partidos e os seus líderes partidários têm interesse em ter consistência
programática ou ideológica. Querem o poder pelo poder", disse ao
responder a pergunta de um aluno sobre a suposta interferência do
Judiciário em assuntos do Legislativo.
Ministro Joaquim Barbosa no plenário do STF |
"Está é uma das grandes deficiências, a razão pela qual o Congresso
brasileiro se notabiliza pela sua ineficiência, pela sua incapacidade de
deliberar", disse o ministro.
O presidente do Supremo afirmou também que o poder, quando não é
exercido, acaba "tomado, exercido por outrem". "Em grande parte no
Brasil esse poder é exercido pelo Executivo".
As críticas ao Legislativo continuaram ao longo da palestra, quando
Barbosa voltou a falar sobre os problemas do Congresso. "O problema
crucial brasileiro, a debilidade mais grave do Congresso brasileiro, é
que ele é inteiramente dominado pelo Poder Executivo", afirmou. "O
Congresso não foi criado para única e exclusivamente deliberar sobre o
Poder Executivo. Cabe a ele a iniciativa da lei. Temos um órgão de
representação que não exerce em sua plenitude o poder que a Constituição
lhe atribui, que é o poder de legislar", afirmou Barbosa, sob o aplauso
dos presentes.
Ao longo de sua palestra, quando tratava sobre regras e limites impostos
aos Poderes para evitar excessos de um sobre os outros (freios e
contrapesos), Barbosa citou a votação da semana passada, que aprovou a
Medida Provisória dos Portos, como um "contraexemplo" desses limites.
"Os excesso da Câmara dos Deputados podem ser controlados pelo Senado
Federal. Ou seja, o Senado, como é um órgão composto por pessoas mais
idosas, experientes, em geral ex-governadores, poderia controlar, conter
os excessos e saliências da Câmara dos Deputados", explicou.
"Mas olha, nós tivemos na semana passada um contraexemplo disso. Uma
Medida Provisória de extrema urgência teve seu tempo de exame de
deliberação esgotado na Câmara até o último dia. E o Senado só teve
algumas horas para se debruçar sobre aquele o texto. Daí se vê a
dificuldade de configuração desse controle do Senado sobre a Câmara dos
Deputados na nossa experiência."
VOTO DISTRITAL
Barbosa ainda defendeu a mudança do atual sistema político que, segundo
ele, possibilita a escolha de representantes desconhecidos do povo. "O
Poder Legislativo, especialmente a Câmara dos Deputados, é composto em
grande parte por representantes pelos quais não nos sentimos
representados por causa do sistema eleitoral que não contribui para que
tenhamos uma representação clara, legítima. Passados dois anos da
eleição ninguém sabe mais em quem votou. Isso vem do sistema
proporcional", disse, defendendo a adoção do voto distrital para os
deputados federais.
Para o presidente do Supremo, "o sistema distrital permitiria uma
qualificação do Congresso Nacional. Cada distrito poderia escolher
pessoas, personalidades que poderiam dar grande contribuição ao país.
Tenho certeza de que a representação nacional ganharia e muito com a
representação dessas pessoas em qualidade".
"Hoje temos um Congresso dividido em interesses setorizados Há uma
bancada evangélica, uma do setor agrário, outra dos bancos. Mas as
pessoas não sabem isso, porque essa representatividade não é clara",
finalizou.
Também na mesa dos palestrantes, o senador Rodrigo Rollemberg (PSB-DF)
defendeu o atual sistema, argumentando que o voto distrital puro poderia
prejudicar a representação de minorias nos Congressos, além de
priorizar assuntos locais, deixando de lado temas nacionais.
"O nosso Congresso Nacional é reflexo da sociedade brasileira,
representa o Brasil com suas qualidades e seus defeitos. É o Poder mais
cobrado de todos", rebateu.
Barbosa, então, explicou ao senador que estava falando não como presidente do Supremo, mas como um professor universitário.
As críticas, no entanto, continuaram. O ministro do STF afirmou, por
exemplo, que a proposta de emenda constitucional que limita os Poderes
da Corte,"significaria o fim da Constituição de 1988".
"Se levadas adiante essas tentativas, nós teríamos destruída a
Constituição brasileira, todo mecanismo de controle de constitucional
que o Supremo exerce sobre as leis. Significaria o fim da Constituição
de 88, eliminaria o controle judicial", afirmou.
Sergio Lima-10.dez.12/Folhapress
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